O belo mundo que nossos corações sabem é possível
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Capítulo 5: Loucura
Eu me tornei louco, com longos intervalos de terrível sanidade. — Edgar Allan Poe
Contrariamente à doutrina do cínico, a História de Interser é (como veremos) não menos racional ou baseada em evidências do que a História da Separação. Nós gostamos de pensar que baseamos nossas crenças em evidências, mas muito mais frequentemente nós arranjamos as evidências de modo a se encaixarem nas nossas crenças, distorcendo ou excluindo o que não se encaixa, procurando evidência do que cabe, nos cercando de pessoas que compartilham delas. Quando essas crenças nos mergulha como parte da História das Pessoas, e quando o autointeresse financeiro e social estão amarrados a elas, é ainda mais difícil aceitar qualquer coisa radicalmente diferente.
É por isso que viver na nova história pode ser às vezes árduo e solitário. Em particular, o nosso sistema de dinheiro não está alinhado à História de Interser, reforçando a competição, escassez, alienação da natureza, dissolução da comunidade e exploração sem fim, e sem reciprocidade, do planeta. Se o seu trabalho não contribui para a conversão da natureza em produtos e dos relacionamentos em serviços, você frequentemente perceberá que não haverá muito dinheiro a se fazer daí. Há exceções — falhas no sistema, assim como tentativas hesitantes de pessoas e organizações benevolentes em usar um pouco do dinheiro deles dentro do espírito da gratidão (ou dádiva) — mas, de longe, o dinheiro como é hoje não está alinhado com o mundo mais bonito que nosso coração sabe ser possível.
Sob o mesmo símbolo, também não estão alinhados nossos sistemas de status social, educacional ou as narrativas dominantes apresentadas pela mídia. Mergulhados no que alguns chamam de “realidade consensual”, a sanidade de alguém é posta em xeque por acreditar nos princípios do interser. Nós somos permitidos a entendê-los como um tipo de filosofia espiritual, mas quando começamos a fazer escolhas a partir deles, quando começamos a vivê-los mesmo que apenas 10%, as pessoas começam a questionar a nossa sanidade. Até nós mesmos questionamos. E com a própria dúvida vem um profundo sentimento de alienação.
Esta manhã mesmo eu ouvi 10 segundos de um noticiário sobre a reforma imigratória. Saltaram à minha mente imagens de um vasto aparato de cercas, pontos de inspeção, cédulas de identidade, documentos, entrevistas, fronteiras, zonas de segurança e de “status” oficiais. E, então, pensei: “Espere um pouco. Não é óbvio que a Terra pertence ao mesmo tempo a todo mundo e a ninguém? E que não deveria existir nenhuma fronteira? Não é hipócrita tornar a vida “não vivível” em algum lugar por meio de decisões políticas e econômicas e, depois, prevenir as pessoas de abandonarem esse lugar?”. Os dois lados do debate nem sequer mencionam esse ponto de vista, tão distante dos limites de um pensamento respeitável que estão. O mesmo vale para praticamente todo assunto publicamente controverso.
E não parece loucura pensar que eu esteja certo e todo o mundo esteja errado?
A um modo, é insano — sendo que sanidade é uma categoria social construída que serve para a manutenção das narrativas dominantes e das estruturas de poder. Se for isso, é hora de sermos loucos todos juntos! É hora de violar a realidade consensual.
Seres humanos são animais sociais, e é irreal e perigoso carregar uma história alternativa por conta própria. Vamos pausar um instante por humildade aqui.
Alguns anos atrás, conheci um homem que vou chamar de Frank. Frank era altamente intelectualizado, com conhecimento para além do superficial em vários campos científicos. O seu trabalho, aquele em que passava oito ou dez horas por dia, era o de cortar palavras de embalagens de produtos e revistas. A partir dessas pistas, ele criou uma vasta e muito abrangente teoria da conspiração. Ele acreditava que, por meio do rearranjo das palavras com tesoura e cola, ele poderia romper a conspiração e mudar a realidade em nome de todos os seres.
Ele trouxe à luz as mais fascinantes conexões. Uma caixa de cereais matinais pode ter “General Mills” escrito na frente. “Mills” contém “mil”, abreviatura de “militar”, e parece que, no texto na parte de trás da caixa, há frases de 19 e 13 palavras repetidamente. Isso chega a 1913, o ano em que o Federal Reserve foi criado. Aha! São os padrões emergindo. Pois esse exemplo mal pega a labiríntica complexidade das teorias de Frank, que junta embalagens, logos, nemerologia e muito mais.
Todo mundo pensou que Frank estava perturbado, mas eu seriamente considerei: “Como sou diferente dele?” Parece uma pergunta trivial, mas acho-na frutífera. Nós dois mantemos uma explicação para o funcionamento do mundo que seriamente viola a realidade consensual. Nós dois estamos rearranjando palavras sacadas de um substrato conceitual e linguístico existente, esperando, com isso, alterar a realidade. Nós dois somos vistos por muitos como desviantes e, por isso, perseveramos indefinidamente sem apoio financeiro ou afirmação social (à época, eu era tão quebrado quanto era desconhecido).
Às vezes, eu “faço cócegas” no meu cérebro com o pensamento de que talvez esse cara, o Frank, esteja certo; que ele é o maior e mais bravo gênio da história, trabalhando em um nível simbólico mágico para salvar o mundo. Se eu apenas tomasse o tempo necessário para mergulhar em seu trabalho, talvez eu também enxergaria.
Você às vezes não deseja que seus amigos e parentes lessem esse e aquele livro, assistissem a esse e àquele documentário, que eles simplesmente abrissem suas mentes e parassem de desconsiderar de antemão a sua visão de mundo? Ah, se eles apenas vissem, eles entenderiam!
Eu não mantive contato com Frank, mas tenho poucas dúvidas de que ele não tenha continuado seu obscuro trabalho até o dia de hoje. Muitos de nós não têm esse tipo de audácia. Somos animais sociais e precisamos de pelo menos um pouco de afirmação. Não podemos ficar em uma história desviante sozinhos. Diante de toda uma sociedade que nos puxa para dentro da História da Separação, precisamos de aliados.
Este livro é feito para ser esse aliado. Eu espero que ele acorde ou reforce o seu entendimento de que você, afinal de contas, não é louco. E que, se algo ficou louco, foi o mundo.
Você poderá dizer que estou pregando para os convertidos. Sim. Mas como membro do coro eu mesmo, estou grato pelos maravilhosos pregadores cujas palavras me mantiveram aqui, me mantiveram acreditando. Sem eles, eu teria desistido há muito tempo e achado um emprego, azeitando as engrenagens da máquina devoradora do mundo. Também é por isso que conferências, retiros e comunidades de cultura alternativa são tão importantes. Nós nos seguramos uns aos outros nas novas crenças. “Sim, eu também vejo. Você não é louco.” Nós, o coro, nos juntamos e aprendemos a cantar juntos.
Conforme as coisas caem aos pedaços e a velha história solta suas algemas no espaço entre as histórias, a linda música do nosso coro acenará e eles virão se reunir conosco na canção. Nós temos feito um trabalho importante. Primeiro, solitariamente; depois, em pequenos grupos marginais. O tempo está batendo à porta para a nova História das Pessoas deixar a incubadora. Quando as coisas caírem aos pedaços, os radicais sem esperança se tornarão o senso comum.